Bolsonaro e a Reforma da Previdência

Protesto de aposentados. Foto Orlando Brito

A Reforma da Previdência ficou para 2019, após os conflitos entre o governo eleito e sua futura equipe econômica com o presidente do Senado e com o da Câmara. “Mais racional”, anteciparam-se analistas de mercado, pois o novo presidente poderia usar a lua de mel com o eleitorado para garantir o núcleo mais importante da medida, que sabem ser um cemitério de popularidade. Só que Bolsonaro sabe que não achou sua popularidade no lixo.

O capitão soltou na opinião pública seu interesse em ver a Reforma aprovada no apagar das luzes da gestão Michel Temer e os chefes das casas legislativas não entenderam o pouco caso prático que fez, em seguida, para conversar sobre o assunto. Na verdade, o presidente eleito parece ter levantado o tema para semear sua visão entre o público dele e mandar recados para o establishment.

Após a concessão de três ministérios a políticos filiados ao DEM, congressistas decidiram alertar, pela imprensa , que a prioridade do capitão em relação à Reforma pode correr risco se ele insistir em negociar com bancadas transversais (ou frentes temáticas) em vez de no tradicional jogo de Brasília. Não entenderam que a governabilidade mudou (veja o que escrevi sobre isso aqui  e aqui ) e que o Jair não concorda em aceitar o Paradoxo de Tostines baseado nos dogmas do sistema político, pelo qual ou vai negociar porque é esperto ou é esperto porque vai negociar.

Em live no dia 09|11, ofereceu a outra face: “Sérgio Moro vai pegar vocês, abra o seu olho. Ele lá agora, ao contrário do que alguns estão falando aí, ele pescava com varinha, agora vai pescar com rede de arrastão de 500 metros. E nós queremos isso. O povo quer isso. Combater a corrupção no Brasil. Combater o que está dando errado para a gente sonhar com aquilo que nós merecemos”, disse.

Para a Reuters, em 10|11 disse que se já estivesse no cargo vetaria a proposta de aumento salarial dos ministros da suprema corte, o que, segundo ele, dificultará os esforços do novo governo para resolver a questão do déficit fiscal porque “complica para gente quando você fala em fazer reforma da previdência, quando você vai tirar alguma coisa dos mais pobres, aceitar um reajuste como esse”. Segundo ele, “afinal de contas é da classe que mais ganha no Brasil [magistratura]”. Ou seja, denunciou à sociedade que o Congresso derrotado nas eleições de 2018, ao chancelar o reajuste do Supremo, compôs um convescote do jogo de Brasília contra os interesses da maioria e para persegui-lo, já que implicará em um gasto adicional de 4 bilhões de reais em 2019.

O presidente eleito ressaltou que sua equipe não considera reformar a previdência da forma proposta pelo governo Temer porque “Se bancarmos propostas dessas e formos derrotados abre espaço para velha política vir para cima de nós… Não posso correr esse risco, tenho que começar o ano que vem com nossas propostas e tentar convencer deputados e senadores a votar de forma paulatina” e, na coletiva que deu dia 12|11 , disse como evitará ser encurralado pelo establishment: “Não pode olhar apenas o número, tem de olhar o social também. O teu trabalho, o meu, é diferente de alguém que mexe com a construção civil. É complicado, precisa ter coração também nessa reforma, não são apenas números. Se fossem apenas números, você não precisava de economia, qualquer um decidiria a questão em cima dos números de forma fria, e nós não queremos isso, queremos algo racional”. Em live de 9|11 já havia dito que “não podemos falar em salvar o Brasil quebrando o trabalhador”.

Perguntado sobre a política de preços da gasolina , outro assunto espinhoso no Congresso e no mercado, disse que “Sem canetaços, sem a mão grande por parte do governo, [as pessoas] querem um combustível mais barato, um gás cozinha mais barato” e, diante de propostas de governadoras que já se assanhavam em “bem receber” a nova gestão no dialeto do sistema político, com sugestões do tipo acabar com a estabilidade dos servidores, vacinou: “Mas grande parte depende dos governadores dos estados, que botam o ICMS lá em cima”.

Bolsonaro quis dizer que não vê a reforma como uma panaceia para a economia e que exigirá sacrifícios do establishment estatal para fazê-la e que sua popularidade não será queimada para satisfazer de qualquer jeito o interesse do mercado. Com isso, alimenta sua popularidade, pois tem que demonstrar apenas disposição de lutar. Vencer é um plus, perder é desgaste para o sistema político.

Oras, então como escrevi no artigo O que esperar do governo Bolsonaro , “A reforma previdenciária é mais provável que seja embalada como um legado em vez de uma entrega imediata, haja vista as dificuldades experimentadas por FHC, Lula e Temer. E a gestão, respaldada pelas urnas, pela governabilidade transversal no Congresso e pelo prestígio (e suporte) das Forças Armadas terá estofo para se blindar contra pressões do mercado. Afinal, todos sabem que Dilma não caiu por causa da situação fiscal”.

Não há razão, na matemática bolsonarista, para ter dado a Temer o bônus de uma grande união pela reforma. Não há para que ceda a Dias Toffoli o protagonismo das mudanças na previdência ou nas soluções para a segurança por meio de um pacto. Tampouco quer virar a página da deposição de Dilma e a prisão de Lula, já que são seus espantalhos, e que se não aceitar uma Reforma da Previdência tão malvista (e mantiver os programas sociais) pode “matar” a saudade restante do lulismo, que deu parte dos 29% dos votos de Haddad no primeiro turno.

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